7 de fevereiro de 2012

O silêncio e a memória: uma relação complexa



Testando a ideia generalizada de que se não falarmos num assunto ele começa a desvanecer-se, Stone tem vindo verificar que a pesquisa não confirma esta hipótese.

Na verdade, a relação entre a memória e o silêncio é bem mais complexa.

Num estudo escrito em parceira com Alin Coman, da Universidade de Pittsburgh, Adam D. Brown da New York University, Jonathan Koppel da University de Aarhus e William Hirst da New School for Social Research, Stone e os seus colegas têm vindo a estabelecer alguns princípios básicos que nos interessa a todos manter presentes.

O silêncio acerca das memórias pode enquadrar-se comportamentalmente numa série de categorias. Pode, por exemplo, resultar de um silêncio propositado; a omissão, no contexto da conversa, pode acontecer simplesmente porque a memória não ocorre ao sujeito; ou o silêncio pode resultar do esforço activo por parte da pessoa no sentido de tentar não se lembrar.

Os investigadores verificaram, então, que o silêncio acerca de eventos passados não promove o esquecimento de uma maneira uniforme ou previsível.

Uma das regras que deduziram aponta para que, numa conversa, as pessoas tenham mais dificuldade em lembrar-se de memórias silenciadas relacionadas com aquilo de que estão a falar de que de memórias silenciadas sem relação com esse tópico.

Este princípio contra-intuitivo pode encontrar aplicações práticas em estratégias comunicacionais promovidas em contextos sociais ou políticos.

(via The Economist)
Um exemplo citado no press release da Association for Psychological Science diz respeito à utilização da suposta existência de armas de destruição maciça como pretexto para desencadear a invasão do Iraque por parte Administração dos E.U.A. liderada pelo Presidente George W. Bush.

Se se quiser que a opinião pública se esqueça da relação das armas de destruição maciça com o início da guerra, diz-nos a regra apurada por Stone e pelos seus colegas, que o Presidente, nesse caso, não deveria evitar falar da guerra e do seu início, mas tendo sempre o cuidado de, nesse contexto, silenciar as referências à questão das chamadas WMD (acrónimo para “weapons of mass destruction”).

Assim, insistindo no tema, mas calando a conexação, o silêncio acabará por dissipar a memória deste logro.

Será talvez útil ter este exemplo presente quando analisamos os múltiplos discursos públicos sobre as várias temáticas que agitam as nossas comunidades, de forma a tentar evitar as tentativas de manipulação e distorção da realidade (ramificações do fenómeno de spin) por intermédio de sofisticadas estratégias comunicacionais.

A um nível pessoal, continua o artigo, se uma mãe questiona uma filha sobre um encontro com o namorado e esta relata o evento sem mencionar à progenitora o fim escaldante da noite, esse silêncio propositado fará com que o final romântico não mencionado se cristalize na memória da rapariga com maior intensidade.

Assim, transportando as ideias do grupo de trabalho de Stone para a pessoalíssima esfera afectiva, é fácil perceber como certos comportamentos parentais, pelo grau de repressão e censura moral que propugnam, acabem por encorajar os miúdos a silenciar certos aspectos das suas vidas, redundando num efeito prático contraproducente: o reforço justamente dos comportamentos menos desejados pelos pais.



Conclui Stone que o “silêncio tem implicações importantes para a forma como nos lembramos do passado que vão para além do simples esquecimento”. No que diz respeito à memória, nem todos os silêncios são iguais.


Aqui fica o sumário (abstract) do trabalho de Charles Stone.


Silence about the past permeates acts of remembering, with marked mnemonic consequences. Mnemonic silence—the absence of expressing a memory—is public in nature and is embedded within communicative acts, such as conversations. As such, silence has the potential to affect both speakers—the source of the silence—and listeners—those attending to the speaker. Although the topic of silence is widely discussed, it is rarely mentioned in the empirical literature on memory. Three factors are employed to classify silence into different types: whether a silence is accompanied by covert remembering, whether the silence is intentional or unintentional, and whether the silenced memory is related or unrelated to the memories emerging in a conversation. These factors appear to be critical when considering the mnemonic consequences. Moreover, the influence of silence on memory varies between speaker and listener. Although rarely mentioned, recent empirical research on memory clearly has a bearing on a topic of such general interest as silence.

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