8 de fevereiro de 2012

Sistemas de valores que estão subjacentes à clivagem política entre Direita e Esquerda


Explorando a temática de um post anterior, e a título de curiosidade, na Atlantic pode encontrar um artigo sobre os sistemas de valores que estão subjacentes à clivagem política entre Direita e Esquerda (ou, na terminologia inerente à realidade política dos E.U.A., entre Conservadores e Liberais).

Sustenta o autor, Thomas Byrne Edsall, que, em regra, a identificação política de cada um de nós traduz a adesão a um conjunto de valores que se reflecte em todos os aspectos da nossa existência social e cívica.

Assim, as diferenças de opinião no debate político muitas vezes traduzem clivagens bem mais profundas na forma de estar e de ver o mundo, o que ajuda a explicar o tom radical que frequentemente permeia o discurso político e a cegueira que ocasionalmente é demonstrada por ambos os lados da barricada face a argumentos válidos produzidos pelos antagonistas.

As pesquisas no campo da psicologia política também tendem a sustentar que as ideologias mais conservadoras (i.e. de Direita) tendem a ser referidas com expressões que habitualmente associamos à masculinidade (força, frieza, austeridade, combatividade, adesão às hierarquias) e mais liberais (i.e. à Esquerda) surgem associadas a aspectos que culturalmente enquadramos na feminilidade (compromisso, tolerância, equilíbrio, sensibilidade e individualismo).

Um estudo de Dana Carney da  Columbia University, John Jost da New York University, Samuel Gosling da University of Texas, e Jeff Potter da Atof, Inc., no seu trabalho de 2008, "The Secret Lives of Liberals and Conservatives:Personality Profiles, Interaction Styles, and the Things They Leave Behind" teorizaram que há certos traços de personalidade associados a orientações liberais ou de Esquerda e outros associados a orientações conservadoras ou de Direita.

Aqui ficam, então, essas marcas "políticas":

Liberais/Esquerda
Desaprumados, ambíguos, indiferentes, excêntricos, sensíveis, individualistas; abertos, tolerantes, flexíveis; amantes da vida, livres, imprevisíveis; creativos, imaginativos, curiosos; expressivos, entusiásticos; excitáveis, buscando sensações; desejosos da novidade, diversidade; descontrolados, impulsivos; complexos, com “nuances”; mentes abertas; abertos a experiências.

Conservadores/Direita
Livres de ambiguidade no pensamento, persistentes, tenazes; duros, masculinos, firmes; fiáveis, confiáveis, com fé, leais; estáveis, consistentes; rígidos, intolerantes; convencionais, vulgares; obedientes, conformistas; temerosos, ameaçados; xenófobos, preconceituosos; ordenados, organizados; poupados, relutantes em gastar ou dar; estéreis; obstinados, teimosos; agressivos, zangados, vingativos; cuidadosos, práticos, metódicos; reservados, contidos; severos, frios, mecânicos; ansiosos, desconfiados, obsessivos; auto-controlados; contidos, inibidos; preocupados com as regras, normas; moralistas; simples, decididos; de mentes fechadas; conscienciosos.

A equipa de Carney descreve o conservadorismo como uma crença ideological que está significativamente (mas não inteiramente) relacionada com preocupações motivacionais que se relacionam com a gestão psicológica da incerteza e do medo. Como tal, preocupações com o medo e a “ameaça” podem também explicar o segundo núcleo do conservadorismo, o patrocínio da desigualdade.




Aqui, importa lembrar o post anterior sobre as possíveis origens do pensamento racista e xenófobo e da sua relação com os medos que nos assolam no confronto com a "diferença".

Um aspecto que a leitura deste artigo não foca, mas que me interessa diz respeito à ocasional desconformidade entre os sistemas de valores que na realidade orientam determinadas pessoas na condução das suas vidas privadas e depois as suas escolhas e alianças políticas. 

Com efeito, é frequente deparar-me com pessoas que se afirmam de Direita, mas que, na realidade, professam um estilo de vida e todo um conjunto de valores que não encontra tradução nas orientações políticas dos partidos dessa linha ideológica.

Por outro lado, também é frequente ver ligados a partidos e facções de Esquerda, pessoas que, na prática, têm uma atitude extraordinariamente conservadora perante a vida.

Em muitos casos, a sensação empírica é a de que os partidos e a predisposição política, para muitos de nós, assume um carácter quase clubístico, definindo-se mais em função do nosso círculo de amizades e relacionamentos e da nossa tendência inata para nos “integrarmos” do que propriamente na sequência de decisões racionais e ponderadas.

Assim se explicará, pelo menos nalguns casos, a incongruência entre o discurso de alguns políticos e as suas escolhas privadas, professando publicamente determinados ideais e tomando, em privado, decisões que apenas fazem sentido quando legitimadas por um sistema de valores antagonista.

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