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14 de fevereiro de 2012

Brainstorming e o pensamento de grupo


(via New Yorker)
Na New Yorker, Jonah Lehrer publicou um fantástico artigo sobre o “pensamento de grupo”, que merece ser lido na íntegra.

Aqui fica, no entanto, uma breve sinopse, com algumas das ideias chave.

A ideia de desenvolver pensamentos e ideias em grupo tem uma longa história, mas recebeu um impulso inovador em 1948, quando um publicitário americano, Alex Osborn, lançou um livro intitulado “Your Creative Power”, no qual se propunha revelar os seus segredos criativos.

Desse livro, o “segredo” que se viria a revelar fecundo foi a descrição do processo de brainstorming, que, desde então, tem vindo a ser utilizado em diversas áreas da actividade humana.

O princípio é simples. Um grupo deve reunir-se e lançar ideias sobre o tema em discussão, sem se preocupar com a qualidade, mas sim apostados em gerar quantidade, muitas vezes através de uma livre associação de ideias. Entra também na equação uma outra regra, que é decisiva: não pode existir qualquer espécie de criticismo ou negatividade nas reacções.

O propósito desta metodologia é impedir que as inibições naturais decorrentes do potencial de receber uma crítica sufoquem boas ideias logo à nascença.

O brainstorming foi um sucesso e entrou na cultura empresarial e popular das sociedades ocidentais.

Só existe um problema. De acordo com os estudos efectuados sobre o assunto, o método brainstorming simplesmente não é eficaz.

Quantidade de ideias? 

Desde o primeiro teste sério efectuado em Yale, em 1958, já se efectuaram dezenas de estudos e todos apontam para as mesmas conclusões.

Na realidade, sessões de brainstorming produzem menos ideias do que se o mesmo grupo de pessoas trabalhar individualmente e depois reunirem as ideias numa reunião subsequente.

Ou seja, o processo brainstorming, ao contrário do que intuitivamente esperamos, não gera uma maior quantidade de ideias do que o trabalho individual.

Mas, e quanto à qualidade?

Osborn estava certo que processos de grupo são hoje incontornáveis.

Na ciência, os trabalhos individuais são incrivelmente menos bem sucedidos do que os esforços colectivos, levando muitos a considerarem que os avanços efectuados conduziram a problemas de tal forma complexos que uma só pessoa não pode simplesmente abarcá-los. Os investigadores são forçados a especializarem-se e a colaborarem, uma vez que os avanços se dão nas intersecções dos seus saberes.

Mas se as sessões brainstorming não correspondem ao método mais eficiente para mobilizar o potencial de um grupo, qual é, afinal, o modelo correcto?

Charlan Nemeth, da Universidade da Califórnia, em 2003, parece ter demonstrado que os grupos que interagem num cenário de debate são os mais produtivos, gerando mais e melhores ideias.

De alguma forma, a crítica (e a antecipação da crítica) força-nos a raciocínios diferentes e mais cuidados. Por outro lado, o simples facto de sermos nós também forçados a analisar criticamente as opiniões dos outros, potencia a produção de ideias próprias mais originais e sólidas, acolhendo já contributos, muitas vezes indirectos, dos outros.

Também a exposição a perspectivas diferentes gera criatividade.

Na realidade, a associação livre de ideias não gera, em regra, ideias criativas. Se alguém disser “azul”, a maioria das pessoas vai pensar em “verde”, “mar” ou “céu”. Se alguém disser “verde”, a maioria das pessoas diz “relva”.

Para gerar criatividade, Nemeth conduziu experiências em que algumas pessoas foram expostas a descrições erradas das cores. Ou seja, um assistente de Nemeth, vendo um painel azul, dizia, em vez disso, outra coisa qualquer. De imediato, em vez de associações óbvias a “céu” ou “mar”, o azul desencadeou respostas como “jazz” ou “tarde de mirtilos”.

Assim, a exposição a pontos de vista diferentes (condições de debate), mesmo que errados (como, por exemplo, neste exemplo da experiência realizada com as cores), abre-nos caminho à criatividade.

E qual a composição ideal de um grupo de trabalho?

De acordo com investigações citadas pelo artigo de Jonah Lehrer, um grupo de trabalho atinge o seu máximo potencial quando mistura um núcleo de pessoas que se conhecem bem com membros exteriores, que conseguem infundir “novidade” nessa estrutura bem oleada.

Se todos nos grupo se conhecerem bem, a tendência será para que caiam nas respectivas áreas de conforto.

Se ninguém se conhecer, todos vão sentir dificuldade em desenvolver as ideias.

E qual a proximidade física que deve existir entre pessoas que trabalham para um mesmo objectivo?

Uma equipa da Harvard Medical School determinou, comparando milhares de trabalhos face ao seu impacto na comunidade científica e relacionando a proximidade física dos respectivos autores, que a qualidade aumenta com a proximidade no local de trabalho.

Os trabalhos mais citados foram produzidos por pessoas que trabalhavam a algumas dezenas de metros uns dos outros.

O número de citações diminui à medida que a distância entre os colaboradores aumenta.

Não obstante os avanços tecnológicos e comunicacionais, o grau de criatividade e qualidade do trabalho de grupo é potenciado pelas frequentes e espontâneas interacções físicas entre os colaboradores.

(via Wired)
Nesse sentido, Lehrer cita o exemplo de Steve Jobs que instalou a sede da Pixar em redor de um átrio central, onde se encontravam as casas-de-banho, os cacifos postais, salas de reuniões e a cafetaria, forçando os vários colaboradores da empresa (animadores, guionistas, desenhadores, etc.) a encontrarem-se várias vezes ao longo do dia. 

Dessa forma, Jobs pretendia potenciar a magia que muitas vezes surge dessas interacções espontâneas entre pessoas que trabalham para um mesmo objectivo, ainda que muitas vezes focadas nas suas áreas específicas de actuação.

A última parte do artigo de Lehrer é talvez a mais fascinante, fazendo alusão ao Building 20, do MIT. Merece realmente uma leitura atenta.


13 de fevereiro de 2012

Uma explicação “genética” alternativa para as desigualdades económicas inerentes às sociedades humanas

Na sequência de um post anterior sobre o tema das desigualdades sociais e possíveis explicações "genéticas", aqui fica a prometida teoria alternativa.


Todos os anos é proposta aos diversos colaboradores da Edge, alguns dos mais brilhantes pensadores da actualidade, uma única questão de natureza geral (no passado, o mote para a reflexão foram questões como "o que mudará tudo?" ou "de que forma a internet está a mudar a forma como pensamos?"), sendo depois os vários contributos coligidos e disponibilizados publicamente.

Para 2012, a Edge pedia aos seus colaboradores que indicassem qual seria a sua “explicação profunda, inteligente e elegante favorita”.

Steven Pinker, num curto ensaio de resposta, referiu-se à possibilidade da genética evolucionária explicar os conflitos inerentes à vida social humana.
(via New York Times)
Sendo a vida complexa o produto da selecção natural, impulsionada pela competição entre semelhantes, os vencedores serão aqueles que melhor mobilizarem a energia e os materiais necessários para se copiarem e depois, numa segunda fase do processo, melhor mobilizarem novamente as suas energias e materiais para ajudarem a que as suas cópias se copiem também.

Assim, a selecção natural favorece a alocação de recursos à descendência e, num segundo plano, àqueles que nos são próximos, numa esfera de influência que se vai expandindo desde a família alargada até às demais células sociais com que nos identificamos (aldeia, região, país, continente, etc.) na exacta proporção em que diminui o incentivo a esse esforço de partilha dos nossos recursos.

Este impulso para transmitir os genes através das gerações explica muitos dos factos da nossa vida social enquanto espécie.

Considerando a finitude dos recursos disponíveis, torna-se, desde logo, evidente que o conflito é inerente à condição humana, como a história , agora sim sem margem para refutação, nos demonstrou.

Será, então, na família (um conjunto de indivíduos com um interesse evolucionário comum na prosperidade mútua) que se encontrará o principal refúgio do conflito. 

Assim se explica que os líderes procurem tradicionalmente transferir o poder para a sua descendência (poder político, mas também poder económico) e que as grandes doações de riquezas ocorram habitualmente no seio da família (tendo o fenómeno sucessório como paradigma máximo).

É neste ponto que, parece-me a mim, podemos encontrar a melhor explicação “genética” para o agravamento do fosso entre ricos e pobres a que o avançar dos tempos conduz.

De facto, a nossa tendência inata para proteger a nossa descendência explica em grande parte as desigualdades sociais que o decorrer do tempo e a sucessão de gerações vão tornando mais evidentes.

Assim, se considerarmos que no nosso desenvolvimento, regra geral, todos beneficiamos das condições criadas pelos nossos pais, é óbvio que aqueles cujos progenitores conseguirem transmitir melhores recursos irão beneficiar de vantagens competitivas que depois, fazendo uso do seu potencial próprio, poderão utilizar como alavanca para uma mais pronunciada progressão profissional.

Essa mais pronunciada progressão, ao contrário do que é sugerido no artigo que comecei por citar no post anterior, não tem necessariamente de resultar de superiores capacidades cognitivas, mas sim, em muitos casos,  de simplesmente se ter partido de uma posição diferente em relação aos demais competidores.

A explicação para a desigualdade pode estar, de facto, nos genes… 

Relacionado com o tema, vale a pena ler o artigo de Pinker no New York Times, "My Genome, My Self".

A explicação para a desigualdade de rendimentos no Ocidente está nos genes?


Leia aqui, na The Atlantic, um artigo perturbante e polémico acerca dos motivos pelos quais, segundo o seu autor, Charles Murray, o fosso entre ricos e pobres nas sociedades ocidentais se tem vindo a agravar. 

Segundo este investigador, vivemos numa conjuntura que valoriza os melhores cérebros e os descendentes das elites estabelecidas, por motivos que tentarei resumir abaixo, supostamente beneficiam de superiores capacidades congnitivas, logo alcançam maiores sucessos profissionais. 

(via The Atlantic)
Para expor a sua teoria, Murray começa por referir que, dada a complexa estrutura organizacional económica das sociedades actuais, o trabalho intelectual é hoje mais valorizado do que nunca.

Assim, as superiores capacidades cognitivas (para utilizar a expressão do autor) de um determinado indivíduo podem hoje ser mobilizadas de forma a que rendam tanto dinheiro que isto tem por efeito o aumento exponencial da remuneração dos mais “inteligentes”.

No fundo, o facto daquilo que está em jogo nos actuais mercados globais serem valores muito superiores àqueles que existiam no passado faz com que o valor atribuído às capacidades intelectuais daqueles que lideram suba também em proporção.

Apoia também a sua hipótese na constatação de que na América, desde 1970, o rendimento das famílias de classe média e baixa tem vindo a cair, a favor das classes mais elevadas. Na realidade, essa queda só não foi mais visível porque a redistribuição fiscal promovida pelos governos atenuou os efeitos desta mudança de paradigma em relação à realidade mais igualitária que havia saído do pós-Segunda Guerra Mundial.

Partindo desta premissa (a de que a elite é melhor remunerada por ter maiores capacidades intelectuais, ideia que adiante abordarei criticamente), Charles Murray sustenta que os pilares da divergência entre ricos e pobres assentam hoje em duas instituições: o casamento e a universidade.

(Refeitório da Universidade de Harvard)
Começando pelo ensino, Murray refere que cerca de 10% das universidades existentes nos E.U.A. acolhem uns espantosos 20% da elite de estudantes cujos resultados nos exames de acesso (os vulgarmente denominados “SAT”) se situaram no grupo de 5% de candidatos com melhores resultados.

Em 2010, pelo menos um dos pais de 87% dos alunos que obtiveram resultados nos SAT acima de 700 (o que é considerado um óptimo registo) tinha formação universitária.

Assentando em dados desta natureza, o autor conclui que as escolas de elite são dominadas pelos filhos das classes média-alta e altas porque estas produzem um número desproporcional de crianças “inteligentes” em relação às demais.

E como é que isto sucede? Por via do casamento.

Assim, sugere o autor, o casamento segue-se à universidade como segundo pilar desta tendência de agravamento das desigualdades sociais.

Neste contexto, o autor refere-se à homogamia, ou à tendência para os indivíduos com características semelhantes se reproduzirem.

Assim, pessoas com formação universitária tendem a casar entre si e, no espectro inverso, pessoas com poucos estudos tendem também a atrair-se mutuamente.

O desequilíbrio neste “mercado dos genes” torna-se ainda mais gravoso quando consideramos que pessoas com formação universitária obtida em escolas de elite tendem também a casar entre si, gerando crianças que, em média, serão, segundo o autor, ainda mais "espertas" ("smart" é a expressão utilizada) que as demais.

A conclusão de Murray e que este espantosamente defende não estar sujeita a refutação, é a de que nas próximas gerações um número desproporcional de crianças excepcionalmente capazes irão descender de progenitores nas classes média-alta e alta, mais especificamente de pais que já pertençam à elite.

Pois bem, toda a argumentação deste artigo, publicado numa das mais prestigiadas revistas americanas, parece-me débil e falaciosa, procurando enviesadamente explicar fenómenos sociais por factores genéticos.

Vejamos porquê.

Comecemos pela premissa a base, a de que os elevados níveis de remuneração que, no fundo, são a causa do agravamento do fosso económico entre as diversas classes sociais, se devem às superiores capacidades cognitivas daqueles que deles beneficiam.

Na realidade, não parece existir nenhuma argumentação "irrefutável" a sustentar esta ideia. Bem pelo contrário, factores como o enquadramento social original e a capacidade de empatia e boa estratégia política no interior das grandes organizações parecem ser os factores preponderantes na obtenção de níveis remuneratórios elevados.

A ser como o autor sugere, os profissionais nos sectores de pesquisa científica integrariam a classe dos melhor remunerados o que, salvo raríssimas excepções, não sucede em lado nenhum.

Como diversos estudos tendem a demonstrar para o sector financeiro, alguns dos profissionais mais bem remunerados nesta área, na prática, não acrescentam qualquer valor especial e o seu estatuto profissional não advém certamente de qualquer mais valia especial em termos cognitivos.

Desconstruindo, então, esta premissa básica, podemos sugerir que o peso do casamento entre iguais não se fará sentir de forma tão evidente na herança genética da descendência (embora seja inegável a sua relevância a todos os níveis, inclusive no que concerne às capacidades cognitivas), mas sobretudo no aumento da possibilidade das crianças serem criadas num meio que, por acção de diversos factores, cultiva e deixa florescer o seu potencial genético.

O enquadramento social também será preponderante para que essas crianças, chegadas à vida adulta, possam usufruir da oportunidade para fazer uso das suas capacidades (e serem remuneradas para tal).

De facto, as crianças que nasçam em "ambientes de elite" tendem a relacionar-se nas suas escolas e na sua vida social com outras crianças igualmente privilegiadas económica e socialmente, pelo que mais tarde, aquando do ingresso na vida adulta, as teias sociais criadas irão potenciar a respectiva progressão profissional. 

Pela negativa, um enquadramento menos favorável tenderá a favorecer relações sociais menos propensas à progressão profissional.

Toda a argumentação contida no artigo, embora aludindo a factos interessantes e que nos devem fazer pensar, parece-me entroncar numa tradição perigosa que procura descortinar nos “genes” a explicação para diferenças de sorte e fortuna entre os homens.

O autor desconsidera a possibilidade da justificação para que uma pequena elite aufira remunerações tão desproporcionais não radicar em maiores capacidades cognitivas genéticas (e portanto recebidas pelos genes dos pais), mas tão somente (ou pelo menos primordialmente) nas diferentes condições de desenvolvimento (não apenas em termos de nutrição e acompanhamento médico, mas também cultural e emocionalmente) e nos diferentes enquadramento sociais que, logo à nascença, separam muitos daqueles que integram as nossas complexíssimas sociedades.

Na realidade, se quisermos encontrar uma base “genética” para as diferenças sociais, então o caminho talvez seja bem diferente e as conclusões acabem por tirar algum brilho deste suposto desfasamento da qualidade da carga genética entre os filhos de uns e os filhos dos outros.


Veja o meu post sobre essa explicação alternativa.


2 de fevereiro de 2012

Existe um limite evolutivo para a inteligência humana?

Uma entrada recente no Science Daily refere que os limites à inteligência humana podem resultar de limitações evolucionárias.

Na verdade, os processos de evolução natural implicam normalmente trocas e cedências, nos termos das quais uma melhoria de determinada característica tem como contrapartida perdas noutra dimensão.

(via saudenacional.blogspot.com)
Um exemplo ilustrativo utilizado passa pela circunstância da maioria dos humanos se ficar por uma altura abaixo do 1,80m e alturas superiores a 2,30, que nalguns aspectos poderiam parecer vantajosas, serem potencialmente prejudiciais, porquanto dificilmente a maioria dos corações resistiria incólume ao esforço bombear sangue para essas alturas.


Este mesmo mecanismo de trocas e cedências no processo evolutivo pode muito bem actuar nas capacidades cognitivas humanas.

Senão, vejamos.

Um aumento do tamanho do cérebro à nascença significaria, por exemplo, que aumentaria também o risco de mortes durante o parto, devido à dificuldade na transposição da pélvis materna pelo bebé. Por outro lado, a estrutura da pélvis dificilmente poderá sofrer uma modificação que facilitasse o parto para crianças com a cabeça maior sem que isso, no reverso da medalha, implicasse transtornos para a capacidade locomoção da mulher.

Por outro lado, tem-se constatado que entre indivíduos com capacidades cognitivas acima do normal, como savants ou pessoas dotadas de memórias fotográficas, o preço cobrado surge normalmente associado a desordens como autismo ou problemas neurológicos emergentes a um crescimento cerebral excessivo.


Nos Judeus Asquenazes, que possuem em média um QI mais elevado que as populações europeias, a contrapartida por essa "vantagem" surge pela frequência com que os membros deste grupo étnico são atormentados por doenças neurológicas.  


(Albert Einstein, via Wikipedia)
Na verdade, parece-me que o ponto mais importante desta linha de investigações é justamente a intuição de que existirá um ponto de equilíbrio nas várias dimensões do desenvolvimento evolutivo físico e intelectual do homem e, como tal, ganhos em determinadas facetas (seja, por exemplo, a inteligência ou o desenvolvimento muscular ou estrutural) acarretam necessariamente modificações que podem ser interpretadas como perdas a outro nível.

Será que a timidez compromete a inteligência?


Na sequência de um post anterior que pode ler aqui, um aspecto complementar a considerar passa pela eventual relação entre a expressão e exteriorização das nossas capacidades cognitivas e as variações nos nossos graus de “audácia” social.

Como relatam Raymond e Lorna Coppinger no seu clássico “DOGS:A Startling New Understanding of Canine Origin, Behavior, and Evolution”, diversos estudos laboratoriais concluíram, seleccionando ratos de acordo com a sua capacidade de encontrar a saída em percursos labirínticos, que a capacidade e, num segundo momento, a velocidade com que alguns animais solucionavam o problema estava mais ligada à audácia do que propriamente a superiores capacidades intelectuais.

Assim, ao cabo de algumas gerações deste processo de selecção artifical os investigadores desenvolveram uma estirpe de ratos que solucionava os labirintos com incrível rapidez.

Todavia, num momento posterior, ao compararem este novo grupo com animais que não haviam sido seleccionados com base no critério de “rapidez na solução do labirinto”, verificou-se que, de facto, os resultados observados no labirinto não tinham qualquer relação com inteligência, mas apenas com diminuição da timidez. 

Alguns animais, sendo mais tímidos (os “pouco inteligentes”) não se lançavam tão afoitos no labirinto, outros (os “inteligentes”), menos receosos, avançavam de imediato, resolvendo com uma aparente destreza um teste que os seus congéneres falhavam. 

O que os investigadores verificaram foi que, ao contrário do que era esperado, o seu processo de selecção artificial não culminou no desenvolvimento de uma estirpe de ratos mais inteligentes, mas sim numa estirpe de ratos mais audazes.


(via ezinemark.com)
Estas experiências, não envolvendo directamente uma correlação entre as dinâmicas de grupo e os níveis de QI como a que é mencionada no post a que fiz referência, fornece um argumento mais para que se considere que existem laços directos entre a audácia e a inteligência ou, com mais precisão, entre a audácia e a capacidade de mobilizarmos e exteriorizarmos as nossas capacidades intelectuais.

Para alguns humanos, as dinâmicas de grupo podem induzir tanto stress como para um rato tímido o ambiente desconhecido do labirinto, mesmo que este não seja abertamente hostil, inibindo-os de mobilizar com efectividade todo o seu potencial intelectual.

Esta constatação lança pistas para a importância que a cultura da desinibição pode assumir no nosso processo educativo. Com efeito, a audácia, embora comporte riscos, é um factor determinante no processo de expressarmos na nossa plenitude num contexto social.

Daqui podemos também extrapolar este raciocínio para a relação entre a desinibição e a criatividade, notando que, com frequência, a uma maior desinibição social estão associados potenciais criativos mais elevados. 

A este respeito, e a título quase anedótico, lembro-me sempre das diferenças que se notaram no mercado publicitário quando, nos anos 80, os profissionais brasileiros começaram a deixar a sua marca em Portugal.

Do Brasil, com a sua cultura de desinibição e liberdade intelectual parecia fluir uma energia criativa que nos parecia quase mágica, transformando as nossas realizações criativas, salvo honrosas excepções, em exercícios tíbios e cinzentos. 

Depois, à medida que a sociedade portuguesa se libertava dos constrangimentos culturais a que décadas de repressão cultural e moral a haviam votado, deu-se uma transfiguração brutal  nas mentalidades e formas de abordar as várias actividades profissionais que, em muitos aspectos, nos deixou numa vanguarda que hoje, tida por adquirida, desvalorizamos e não cuidamos de acarinhar.


Assim, na relação entre timidez, audácia e inteligência, torna-se difícil resistir à tentação de citar Morrissey, o vocalista dos The Smiths, quando cantava:
Shyness is nice
But shyness can stop you
From doing all the things in life you would like to 


1 de fevereiro de 2012

Dinâmica de grupo afecta negativamente o QI de alguns de nós


Como divulga o Science Daily, Investigadores da Virginia Tech Carilion Research Institute desenvolveram trabalhos que parecem demonstrar que as dinâmicas sociais que se estabelecem em pequenos grupos de indivíduos (o exemplo citado reporta-se a júris, equipas negociais ou meros cocktails), para algumas pessoas, tem o efeito de diminuir o seu QI.

As mulheres são mais afectadas pelo fenómeno (10 em 13 mulheres) do que os homens.

A idade e a etnia não demonstraram correlação significativa com o desempenho no ambiente de grupo.

Os sinais implícitos expressos em dinâmicas de grupo parecem afectar a capacidade de expressão cognitiva de algumas pessoas e as respostas cerebrais associadas.

Considerando que uma porção tão grande da nossa vida profissional e social se dá no seio de pequenos grupos, não deixa de ser interessante verificar que para um significativo número de nós, a pressão social influi directamente nas capacidades cognitivas.

No fundo, o que este estudo nos alerta é para as cautelas que devemos ter em julgar o potencial dos outros quando inseridos em contextos de grupo, mantendo-nos alerta para como a dinâmica inerente a esse contexto pode afectar o desempenho individual.

(via Wikipedia)
Olhando para esta imagem é fácil intuir que, perante a presença do Presidente Obama, para muitas das pessoas sentadas à volta da mesa será difícil discordar abertamente e mesmo interiormente ser-lhes-á difícil resistir ao impulso de se deixarem levar pelo carisma e poder de uma figura com a dimensão institucional daquele, ainda que esteja, por hipótese, a pronunciar as mais óbvias parvoíces.

29 de janeiro de 2012

Ecolocalização humana: conheça Daniel Kish


Conheça aqui, através da Men's Journal, a história fascinante de Daniel Kish, um homem cego desde o primeiro ano de vida, que desenvolveu verdadeiramente surpreendentes capacidades de ecolocalização.

Utilizando estalidos da língua que depois são devolvidos pelos objectos físicos em seu redor, Kisch consegue desenhar uma espantosamente precisa imagem mental do seu ambiente.

(via Men's Journal)

Utilizando a ecolocalização, de uma forma semelhante à que permite aos morcegos deslocarem-se na escuridão absoluta de uma qualquer caverna, Kisch consegue praticar ciclismo nas ruas de Los Angeles ou nos trilhos de montanha da Califórnia e localizar objectos a dezenas de metros.

Não sendo o primeiro cego a desenvolver capacidades de ecolocalização humana, Kisch elevou os processos a um nível até aqui nunca imaginado e desenvolveu uma fundação, a World Access for the Blind, vocacionada para ensinar a outros cegos a utilizarem a ecolocalização como forma de conquistarem uma autonomia que a cegueira, de outra forma, lhes negaria.